“Na natureza nada se cria, nada se perde, tudo se transforma”, como já afirmava Lavoisier em seus estudos sobre a matéria, tudo que existe sofre transformação, muda e passa a assumir uma outra forma. Todos aqueles que hoje são pequenos e inocentes bebês, logo virão a ser adultos com suas características e complexidades específicas. A mudança e a adaptação ao mundo adulto são umas das temáticas abordadas pelo peculiar filme Floresta para as Árvores (2003) da diretora alemã Maren Ade.
Floresta para as Árvores conta um pouco da trajetória de Melanie Pröschle (Eva Löbau), uma jovem professora que acabou de se formar com 27 anos, e que está se mudando para outra cidade a fim de exercer sua profissão como educadora. Animada pela expectativa de cativar os alunos e fazer novos amigos, Melanie começa sua nova rotina em um ambiente diferente do que ela vivia, porém, a jovem logo percebe que não será fácil como imaginava.
O filme possui uma estética simples em uma estrutura linear de contar, porém, possui uma fotografia crua com o uso de luz natural, câmera na mão e uma leve granulação na imagem. Estas se justificam por esse ser um trabalho de conclusão de graduação de cinema da diretora, porém Maren Ade não deixa de exprimir sua forma de fazer cinema, já que Floresta para as Árvores carrega um leve teor autoral, assim como os outros trabalhos da diretora.
Temos na tela uma personagem que parece viver um mar de desventuras, e o filme vai seguindo uma crescente de fracassos. A sua performance como professora deixa a desejar, Melanie tem dificuldades de controlar os alunos na sala, fruto da falta de experiência prática na área de pedagogia, pois ela não desenvolveu a habilidade de impor autoridade e respeito, algo que a faculdade não ensina.
Além das dificuldades no trabalho, Melanie também tem não consegue ter sucesso em fazer amizades, e se incluir no meio social lugar em que estão inseridos seus colegas de trabalho e vizinhos. Porém, ela até tem alguns momentos de descontração com sua vizinha, a independente Tina Schaffner (Daniela Holtz). Melanie parece querer a amizade de Tina desde que ela a viu pela janela de seu apartamento, pois se tratava de uma outra pessoa que morava só, assim como ela, o que gerou uma identificação por parte da protagonista.
Melanie e Tina até parecem começar uma relação de amizade, as duas visitam os apartamentos uma da outra, conversam brevemente sobre assuntos banais, porém parece haver uma possessão por parte de Melanie, fazendo-a se envolver mais que o normal. Ela ultrapassa alguns limites, como por exemplo, invadir a privacidade da recente amiga. Esta atitude acaba afastando cada vez mais Tina, que prefere manter distância, deixado a jovem professora cada vez mais aflita e solitária.
O humor negro é presente em alguns pontos do filme, como quando Melanie vai falar com a mãe de um aluno, e novamente a moça é rebaixada pela falta de autoridade. De certa forma, este detalhe caracteriza o traço da direção, já que Floresta para as Árvores não é um filme de gênero, e nem pretende ser. Ele apenas acompanha uma personagem que tem dificuldades de se adaptar ao universo adulto, de fazer amigos, e que aos poucos é excluída socialmente por não conseguir se adaptar.
Talvez o mundo que Melanie desejava viver fosse diferente do que ela teve de encarar, por isso não entende onde de fato ela erra em suas ações. A mudança da juventude para a responsabilidade adulta pode ser sufocante para certas pessoas. Fazer amizades já não é tão simples como na infância, as pessoas podem ser maldosas. É a realidade, e a realidade é assim, e é preciso mudar para conseguir sobreviver.
E o título do filme se trata exatamente disso, do desejo de haver um lugar certo para cada coisa, o lugar ideal para as árvores é a floresta, porém nem sempre se vive no lugar ideal. Talvez Melanie seja uma personagem que esteja em negação a sua posição como adulta, o que justifica o surpreendente desfecho em que a jovem deixa de assumir a direção do veículo em que dirige para sentar-se no passageiro.
Assim como a vida, o filme possui um final aberto. Ele acaba e a protagonista não consegue reverter seus problemas, e nem saberemos se alcançará. Por que não importa para a direção mostrar o sucesso, mas sim o fracasso e como a personagem reage a ele, pois nem todos serão bem-sucedidos. É por isso que Floresta para as Árvores é uma obra singular, já que exprime com maestria as particularidades da realidade diante da vida social.
TÍTULO ORIGINAL: Der Wald vor lauter Bäumen
DIRETOR: Maren Ade
ANO: 2003
PAÍS: ALEMANHA
GÊNERO: DRAMA
DURAÇÃO: 81 MIN
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