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“Mate-me por favor”, um retrato da liberdade e do medo no mundo contemporâneo.


Todos nós ou já passamos ou iremos passar pela juventude, um dos períodos mais conturbados do desenvolvimento humano. Esse é eminentemente um momento de descoberta individuais. É nessa fase que o indivíduo pode ter uma pequena prova de autonomia, porém, sabendo que ainda há muitos perigos mundo afora. Essa temática parece ser um dos pontos maior inflexão em“Mate-me por Favor” da diretora Anita Rocha da Silveira.


Diante de uma onda de assassinatos e estupros na área da Barra da Tijuca, corpos de mulheres são encontrados todos os dias em um terreno abandonado. Para suprir sua necessidade de respostas, a população começa a imaginar quem seria o assassino, e a criar hipóteses sobre o caso.


É neste cenário que Bia (Valentina Herszage), está inserida. Jovem e rebelde, ela encontra-se na fase da descoberta de seu sexo e tem na companhia da suas amigas um dos pontos de maior segurança. O fato de estarem ocorrendo assassinatos próximo a sua escola, deixa Bia e suas colegas com medo, mesmo que a morte seja um jogo tomada por cada uma delas. E é neste universo de violência e incertezas que as jovens caminham em direção ao seu futuro.


O filme traz uma paisagem característica, com prédios altos, muros que trazem uma ideia de segurança, junto com a ambiguidade de um perigo iminente. A história é basicamente contada na perspectiva das jovens. Não há adultos em cena. Isso é interessante já que o longa traz em primeiro plano os anseios, as vontades e sensações de uma juventude que se depara com a existência de um mal, fruto de uma mente perturbada.

Em muitos momentos, por falta de uma explicação clara, nós, espectadores, somos levados a procurar quem é o assassino. Esperamos que o filme nos tire essa dúvida. Mas ele nos traz possíveis culpados sem confirmar nossas hipóteses. Essa dúvida nos faz perceber que qualquer um pode ser um sociopata ou assassino, revelando mais sobre a sociedade que vivemos do que sobre os suspeitos.


Só pela trama, o filme pode remeter a algumas referências de algumas obras de terror como “Halloween” ou “Sexta-Feira 13”. No entanto, possui uma decupagem mais estilizada, fazendo uso de muitas cores, luz neon e música. A diretora usa o suspense como combustível para desenvolver a trama e dispensa explicações, desejando apenas que seu público sinta as mesmas angústias dos jovens na tela. Essas questões são colocadas também a partir de algumas variações tonais do humor negro, aliada a uma estética exibicionista que pode, em alguma medida, até gerar alguma exaustão no seu espectador.


O terror que a diretora traz nesta obra está na mente de seus personagens. É como se a violência e o medo fossem um vírus que contaminasse aqueles adolescentes, de alguma forma. E que deixassem seus corpos neutralizados, como zumbis. Tudo isso é colocado na tela pela gradual aparição dos jovens carregados de hematomas e ferimentos. Se trata aí de uma geração contaminada pela depressão, e sem esperança no futuro. Toda essa dor e esse sofrimento ultrapassa a barreira da simbologia alegórica e se materializa na corporeidade dessas figuras.

É interessante notar o fascínio que Bia possui para com as mulheres mortas. E por elas é a quem a protagonista claramente se identifica. Isso pode ser interpretado como o que chamamos de “pulsão de morte”, vinculada à culpa de ser mulher que nutre esse desejo de liberdade. Isso, por si só, já a torna uma possível vítima. E talvez isso seja aquilo o que detona na garota esse impulso de se viver tudo aquilo o que ela ainda não viveu em sua mais intensa forma, antes da chegada do dia da sua morte.


Diante da liberdade e do medo, vemos Bia caminhar sozinha pela cidade e só depois perceber o perigo que corre naquele contexto. Só assim ela pode sentir-se viva por poder escolher estar ali, mesmo que haja o risco de ser morta ou violentada. Isso, ao meu ver, é um possível retrato da resistência feminino, que ainda persiste em na sua liberdade, mesmo no violento mundo em que se encontra.


Mate-me por favor é um obra que carrega muitas questões como a depressão na juventude, a violência urbana e os conflitos envoltos na sexualidade. Não é um filme de narrativa simplista. Há uma forte carga de complexidade contida nela. Porém, ainda pode ser uma boa experiência para quem quer refletir sobre a sociedade patriarcal, o ser humano, o medo ou sobre a resistente existência da mulher no mundo contemporâneo e violento tal qual o vivenciamos.



Título: Mate-me por favor

Direção: Anita Rocha da Silveira

Ano: 2015

País: Brasil


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