top of page
Buscar
  • Foto do escritorraianecfferreira

PIGGY | AQUILO O QUE SOBRA DO SANGUE E DA DOR




O horror é um gênero cinematográfico que utiliza dos medos, fobias, loucuras, o sobrenatural e das formas de violência para criar histórias que podem vir a decifrar algumas das mais especificas características de uma sociedade doentia. Quando pensamos no universo da população jovem, o Bullying se apresenta como um grande desafio por ser um dos tipos de violência que mais afetam essa parcela da sociedade. Essas são experiências que, muitas vezes, podem se assemelhar a um filme de terror. É com base neste pensamento que Carlota Pereda constrói o filme Piggy, que em tradução para o Portugês pode ser lido como “porquinha” e que foi exibido no Festival do Rio no ano de 2022.


Piggy conta a história de Sara, que sofre bulling por estar acima do peso. O filme de 2022 é inspirado no curta-metragem de mesmo nome, onde Pereda conta, de forma sucinta, os horrores que a menina vive. Porém, em seu longa consegue aprofundar sobre as formas de violência que afetam o corpo, principalmente o feminino.


No início da obra, o incômodo prevalece em quase todas as cenas. Existe a referência clássica ao universo adolescente comum nas produções Hollywoodianas, onde estão presentes múltiplos estereótipos, como o das patricinhas e o da menina diferente que sofre bullying. Sara é essa garota tímida que é perseguida pelos outros jovens por estar acima do peso, sendo constantemente chamada de porquinha.


Uma improvável conexão entre um assassino e a moça acontece justamente no contexto dessas “brincadeiras”, entre aspas, estabelecidas pelas garotas. Ao presenciar uma violência cometida pelas garotas para com Sarah, o personagem cria uma conexão com a protagonista. Depois disso, todos que cometem algum abuso sob a jovem se torna um alvo do facínora em questão.  


Podemos até identificar uma certa brincadeira com o conto de fadas “A Bela e a Fera”, o que nem é tão necessário e interessante, a meu ver, já que a diretora deixa de desenvolver algumas nuances do suposto romance. 


O aspecto estético do filme chama atenção pelo olhar diferenciado ao colocar elementos que fogem do convencional filme de horror. Elementos estes que estão mais próximos do surreal e que causam estranhamento. A maior parte do desconforto é causado pelas cenas de violência para com a protagonista. O espectador é quase obrigado a ver a menina sofrendo. É um incômodo que, curiosamente, sobressai aqueles proporcionados pelas imagens gráficas das ações do assassino. 


Para mim, o que mais chama atenção em Piggy é a reflexão que ele aciona através do tema da violência. A fisicalidade da matéria humana é o ponto principal no filme. Os corpos femininos, independente da posição em que estejam na narrativa, são elementos condenados, assim como os corpos dos animais pendurados em um açougue. A violência que o Serial Killer aciona na “carne” de suas vítimas, tem semelhança com a que Sara sente em seu corpo todos os dias.


A protagonista está constantemente lutando contra a forma como os demais julgam a sua corporeidade. A sua aparência não se restringe ao espaço público, mas gera incômodo também na particularidade da sua casa, na intimidade do familiar. São pequenas violências que acabam sendo validadas e executadas pelos próprios pais da garota. Este tipo de agressão também fere e causam consequências para toda uma vida. Assim, a figura do Serial Killer pode ser entendida como a personificação da raiva de Sara. Porém, aqui, a diretora trabalha essa ideia de forma literal, já que existe de fato um assassino na cidade. 


O filme não fala apenas de problemáticas como a gordofobia e o bullying, mas também sobre as vulnerabilidades do corpo feminino diante das estruturas do patriarcalismo. Algo que a diretora faz com êxito. Porém, me incomoda um pouco a escolha por introduzir na trama uma figura masculina monstruosa que seria a única criatura que ajuda Sarah naquela cidade. Talvez essa escolha vem de todo o deslumbramento que a persona do assassino em série possui em várias produções audiovisuais e na cultura pop norte-americana.


O filme nos coloca em um grande empasse, afinal, quem é pior: o conhecido que te maltrata todos os dias ou o desconhecido amigável mas que esconde segredos terríveis? Para Sara este é o grande dilema da sua existência, uma vez que, para ela, não sobram escolhas boas e no fim tudo o que resta é sangue e dor.


1 visualização0 comentário
bottom of page