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SORRY BABY | O AMADURECIMENTO EM MEIO AO TRAUMA

  • Foto do escritor: raianecfferreira
    raianecfferreira
  • há 3 minutos
  • 3 min de leitura

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Titulo: Sorry Baby | Diretora: Eva Victor | País: Estados Unidos, França | Ano: 2025


Quando penso em narrativas de amadurecimento, a imagem que me surge é a de um caminho — não um simples ponto de partida e de chegada. Amadurecer é permanecer em movimento, é atravessar a vida em constante transformação. Nesse percurso, encontramos pessoas queridas, construímos amizades, exercitamos a empatia. Mas também cruzamos com aqueles que nos ferem, que nos fazem sangrar. Ainda assim, seguimos adiante nessa longa caminhada.


Dentro desse universo de histórias marcadas pelo trauma e pela evolução pessoal, destaco o filme de Eva Victor, Sorry, Baby. Nele acompanhamos Agnes, uma jovem de temperamento calmo e de sinceridade quase desarmante, que se destaca na turma de literatura inglesa na universidade. Sua inteligência e suavidade chamam a atenção do professor — também seu orientador de trabalho final. O que inicialmente parece um flerte inocente e uma relação de admiração transforma-se, aos poucos, em um peso doloroso.


Agnes recebe a visita de Lydie, sua amiga grávida. Enquanto tudo à sua volta parece avançar, a protagonista permanece no mesmo lugar: mesma casa, mesma cidade, mesmo emprego. O longa inicia pelo meio da história, e só depois revela os acontecimentos que, anos antes, estagnaram a vida da jovem nessa espécie de suspensão.


O mais interessante é a escolha da direção de não mostrar a violência. A agressão não é dada a ver, mas sentida. Sabemos que algo grave ocorreu pela reação de Agnes ao deixar a casa do orientador e por seu comportamento a partir dali. Essa decisão demonstra maturidade e respeito pela personagem. Por não exibir o abuso, o filme convoca o imaginário do espectador — memórias, referências, temores — para preencher a lacuna. Preserva-se a personagem dessa exposição e também o público, tão acostumado a ver essa violência reproduzida de maneira explícita no cinema. Alguns exemplos temos O Último Tango em Paris (1972), Irreversível (2002) e O Escândalo (2019), todos dirigidos por homens e sem nenhum cuidado no trato com às cenas de violência.


Não mostrar, aqui, se torna um gesto é também político. Precisamos realmente assistir, mais uma vez, uma mulher sendo violentada? Não. A diretora preserva o tom da obra, sem excessos, acompanhando as personagens com honestidade e delicadeza. O foco se desloca para o percurso de Agnes: não o de superar o episódio, mas o de continuar vivendo apesar dele, apesar da consciência constante de que ainda está vulnerável a novas violências simplesmente por ser mulher.


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O filme se desdobra em muitas nuances: uma universidade que falha em acolher, colegas indiferentes, a impunidade do agressor, o medo que se instala na possibilidade de novos vínculos. Cada elemento reverbera muito além da narrativa. Agnes, com sua fala franca e seu olhar cansado, atravessa quase tudo em silêncio. É como se seu brilho, sua motivação e sua esperança tivessem sido roubados naquele instante, e agora ela precisasse, pouco a pouco, recuperar o que lhe foi tirado.


Sorry, Baby não é apenas um filme sobre trauma. O trauma existe, mas existe também o desejo de seguir, de reconhecer-se para além do que lhe aconteceu. Feridas não cicatrizam rápido, mas podem ser acolhidas, compreendidas e integradas de modo que cada pessoa se perceba mais do que um corpo ferido.


Ao fim, temos uma obra que nos toca não só pelo tema, mas pela maneira como o aborda, coerente com sua proposta e sutil no uso da linguagem cinematográfica. É belo acompanhar a trajetória de Agnes, que não é feita apenas de dor, mas de vida, com todos os altos e baixos que compõem a experiência humana.


 
 
 

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